Toda vez que há um lançamento de filme nacional, a primeira pergunta é sobre o tema, que varia entre ditadura militar e o sertão nordestino. Sobre os Anos de Chumbo, os exemplos mais recentes são “O Ano em que os Meus Pais Saíram de Férias“, “Zuzu Angel“, “Olga“; na semana que vem estréia “1972” sobre jovens roqueiros.
Já no quesito sertão, a lembrança segue rapidamente em direção a longas-metragens como “Cinema, Aspirina e Urubus”, “Abril Despedaçado”, “A Máquina”, “Tieta do Agreste”, “O Auto da Compadecida”, e por aí vai.
Nesta sexta-feira, dia 17 de novembro, estréia “O Céu de Suely” (que se passa no sertão), filme dirigido por Karim Aïnouz (“Madame Satã”) e participou neste ano do Festival de Veneza e do Festival de Toronto. No Festival do Rio, ganhou prêmios de Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Atriz.
Na trama, só se saberá quem é Suely da metade para frente. O papel principal é de Hermila Guedes, que faz Hermila, uma cearense de Iguatu, que havia ido para São Paulo com o marido em busca de melhores condições. No entanto, ela retorna à cidade natal dois anos depois, sozinha e com um filho no colo. Ela vai buscar abrigo na casa da avó e da tia Maria (Maria Menezes).
Enquanto isso, aguarda a chegada do marido, prevista para um mês depois. Os dois pretendem montar na praça da cidade um local para cópia de CDs e DVDs.
Para garantir o ganha pão, Hermila faz bico no posto de gasolina como frentista e à noite vai ao forró se divertir com a tia e com Georgina (Georgina Castro), uma prostituta que ganha a vida satisfazendo caminhoneiros que estejam de passagem pela cidade. Juntas, as duas fumam maconha e cheiram acetona.
Durante uma noitada, Hermila reencontra um antigo namorado, João (João Miguel), com quem tem novamente um romance. Os dois se envolvem, transam, mas Hermila continua esperando o marido, que não aparecerá mais.
Em virtude do desapontamento, ela vai à rodoviária perguntar para onde há a passagem mais longe dali. A caixa informa que é Porto Alegre ou Pelotas, no Rio Grande do Sul, e o trecho sai por pouco mais de R$ 450.
Inspirada pela amiga prostituta, Hermila resolve “se rifar”, já que estava acostumada a comercializar rifas de uísque aos moradores da cidade. Desta vez, ela vai vender “uma noite no paraíso” em sua companhia. Mas não é Hermila quem vai. É Suely.
A partir de então, a trama muda o seu curso e a moça de 21 anos sofre preconceito na cidade, a avó manda-a embora de casa e as mulheres dos rapazes que compraram a sua rifa estão em polvorosa. Hermila, ou Suely, porém, não se intimida.
Sabe que precisa de dinheiro para sustentar o pequeno Mateus, já que o pai não toma conhecimento, e precisa comprar uma passagem para bem longe do sertão cearense.
O diretor Karim Aïnouz faz um filme intimista, revelando aos poucos os segredos de cada personagem. Com a câmera, ele percorre os locais por onde Hermila passa. Autor do roteiro, Aïnouz optou por não trocar os nomes originais das personagens principais, como é possível reparar. A iniciativa, no entanto, não quer dizer que cada um esteja interpretando a si mesmo. Nada disso.
A história vai desvendando cada mistério e cada personalidade aos poucos, sem pressa, mas sempre com poesia e delicadeza. As cenas de sexo são ousadas, mas não ofendem.
A fotografia de Walter Carvalho (“Cazuza – O Tempo Não Pára”) fez o sertão caloroso, quente e com céu extremamente azul. Assim como em “Madame Satã”, Walter Salles também é o produtor de “O Céu de Suely”. Uma parceria com Aïnouz que tem tudo para continuar dando certo. O público que prestigia o cinema nacional agradece.