Memória Cinematográfica

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Francis Ford Coppola

Entrevista 20 dezembro 2010
Foto: Guilber Hidaka/A Magazine

Qual é o primeiro filme que lhe vem à cabeça quando se fala em Francis Ford Coppola? Se for “O Poderoso Chefão”, saiba que não é o único. A trilogia, que começou em 1972, rendeu ao diretor fama, dinheiro, prêmios e a lembrança de milhares de pessoas ao redor do mundo, mesmo mais de 38 anos depois.

Além da trilogia, Coppola é autor de outras obras igualmente importantes, como “Apocalypse Now”. Hoje, aos 71 anos, ele nem pensa em se aposentar. No início de dezembro, o cineasta esteve em São Paulo e no Rio de Janeiro para lançamento de sua mais nova obra: “Tetro. O longa-metragem tem roteiro original de sua autoria e é o primeiro desde “A Conversação” (“The Conversation”), de 1974. A trama se passa na Argentina e conta a história de dois irmãos: Bennie (Alden Ehreinreich), de 17 anos, e Tetro (Vincent Gallo). A bordo de um navio, Bennie chega a Buenos Aires com o objetivo de encontrar seu irmão mais velho, que está desaparecido há mais de uma década.

A família dos rapazes, de sobrenome Tetroccini (daí o nome Tetro), se mudou da Itália para a Argentina quando eles ainda eram crianças mas, graças ao sucesso do pai (Klaus Maria Brandauer) como maestro, logo foram viver em Nova York. E depois Tetro, que na verdade nasceu Angelo, voltou para a América do Sul, onde se casou com Miranda (Maribel Verdú), médica que conheceu enquanto estava no manicômio. Mas quando Bennie encontra o irmão, não é quem esperava. Isso porque Tetro tornou-se um poeta melancólico, bem diferente da pessoa que Bennie se lembrava.

Qualquer semelhança com a sua vida real e com o longa-metragem “O Selvagem da Motocicleta” (“Rumble Fish”), lançado em 1983, com Matt Dillon no elenco, não terão sido meras coincidências. E quem atesta é o próprio Coppola, durante a entrevista coletiva realizada no auditório da Faap (Fundação Armando Álvares Penteado), em São Paulo. A começar de seus pais que foram da Itália para os Estados Unidos.

“Tetro” marca um retorno para as histórias familiares. Como lembra Stéphane Delrome, autor da edição “Master of Cinema”, dos Cahiers du Cinéma, o papel de Bennie seria de Matt Dillon, sugerindo que Rusty James, de “Rumble Fish”, pode ter se tornado um desiludido garoto da motocicleta.

Francis tem um irmão cinco anos mais velho e queria ser como ele. Daí o tema central de “Tetro”: irmão que vai atrás do outro e o admira. No filme, aliás, o mais novo também se torna escritor. Dono de vinícolas no estado da Califórnia, Coppola hoje em dia usa o dinheiro que ganha com a venda de seus vinhos para financiar os seus filmes e, assim, não precisa de outros produtores, principalmente porque faz filmes de baixo orçamento e sempre com a intenção de aprender alguma coisa. “Quero fazer filmes que explorem minha vida, pois você acaba aprendendo sobre você mesmo e entendo sobre a minha família coisas que eu não entendia. O grande prazer da vida é aprender”, afirma.

Ele conta também que seria um presente se acordasse de manhã com um assunto e pudesse fazer um filme. “Eu não faço filmes para ganhar dinheiro ou ficar famoso, mas para aprender a fazer cinema e aprender sobre mim mesmo. Se você come muito, fica gordo. Se corre atrás de belas garotas, deixa sua mulher furiosa. Aprender não é só uma alegria, mas faz bem para você.”

Durante a coletiva, Coppola aproveitou para elogiar o trabalho da filha, Sofia (autora de “Encontros e Desencontros”, “Maria Antonieta” e de “Um Lugar Qualquer“, ganhador do Leão de Ouro em Veneza, e ainda sem data de estreia no Brasil) e falou sobre um dos momentos mais impactantes de “Tetro”: quando o pai fala para o filho que “só há lugar para um gênio” na família. “A frase não foi dita por mim nem para mim, embora seja muito dolorosa.”

Em “Tetro”, há uma crítica de teatro, Alone, que é interpretada por Carmen Maura. Ele conta que o papel foi inspirado na obra “Noturno do Chile”, do chileno Roberto Bolaño, no qual há um personagem que é um crítico. “No Chile, há um crítico chamado Alone. Javier Barden faria este papel, mas depois do Oscar ele não pôde. Eu ia usar outro nome para o personagem, mas como é uma mulher que fez o papel, resolvi manter o nome do crítico verdadeiro.”

Coppola diz também que acha saudável se inspirar em outro artista. “Meu pai, que é músico, tem um slogan: ‘roube sempre dos melhores’. Músicos estão sempre roubando. Quando eu estudava teatro, admirava Tenessee Williams, Elia Kazan e Marlon Brando. Só agora tive a chance de colocar isso nos meus filmes.”

O cineasta este à vontade durante a entrevista e disse, assim que chegou, que estava sonolento, então que os jornalistas o perdoassem se estivesse esquecendo os nomes. No entanto, ignorou o apelo das assessoras de imprensa quando pediu para terminar a entrevista e ele ainda deu oportunidade para que mais quatro perguntas fossem feitas pelos repórteres. De bom humor e com modéstia extrema, ele afirma que, no geral, as pessoas são generosas com ele, de modo que olham os filmes que fez há 30 anos, como a trilogia de “O Poderoso Chefão”, e os admiram. Mas ele brinca quando diz que não vai estar aqui em 30 anos para saber o que as pessoas acham dos filmes que fez agora.

Sobre o futuro do cinema, Coppola afirma não gosta muito da tecnologia 3D, principalmente porque não gosta de usar os óculos necessários. Segundo ele, “o cinema é feito de roteiro e atuação”. “O meu novo filme tem duas cenas em 3D. Uma no meio e uma no final. Mas o 3D é o menos importante.”

Na época do colorido, imagens que extrapolam a tela, Francis Ford Coppola resolve lançar um filme em preto e branco e é elogiado. “Eu queria fazer ‘Tetro’ em preto e branco porque acho bonito. O preto e o branco têm diferentes tons de cinza e os fotógrafos expressam melhor as luzes e as sombras. Fiz preto e branco tal como fiz ‘O Selvagem da Motocicleta’ (‘Rumble Fish’)”, explica. E o colorido em algumas cenas foi usado para diferenciar as imagens em flashback de um modo que as pessoas pudessem entender que se tratava do passado.

O diretor ainda comentou sobre a escolha de atores não muito consagrados, às vezes até desconhecidos, e atores jovens. Ele conta que gosta de trabalhar com todas as idades e que prefere os desconhecidos porque é o que pode pagar. Sobre possível dificuldade de trabalhar com Vicent Gallo, ele conta que não teve nenhum problema, nem com com o Val Kilmer, que vai estrelar sua próxima obra, ‘Twixt Now and Sunrise’, também pessoal, mas em cor.

Biografia

Nascido em Detroit, nos Estados Unidos, dia 7 de abril de 1939, Coppola teve sua primeira nomeação para o Globo de Ouro de Melhor Atriz com a versão para cinema do musical da Broadway, “Finian’s Rainbow”, protagonizado por Petula Clark e pelo veterano Fred Astaire.

Em 1971, o cineasta ganhou um Oscar pelo seu roteiro em “Patton”. Em seguida, foi indicado como roteirista e diretor de “O Poderoso Chefão”, assim como para “O Poderoso Chefão II”, em 1974, quando ganhou de Melhor Filme.

Após o sucesso dos dois longas-metragens, Coppola dedicou-se a “Apocalypse Now”, baseado em “Heart of Darkness”, de Joseph Conrad. A realização do filme foi marcada por inúmeros problemas, desde tufões e abuso de drogas, até o ataque de coração de Martin Sheen e à aparência inchada de Marlon Brando, que Coppola tentou esconder, filmando-o na sombra. O filme foi adiado tantas vezes, que chegou a ser alcunhado de “Apocalypse Whenever”.

Somente em 1982 é que Francis voltou à realização, com o filme “One From the Heart”, um grande fracasso, quando contraiu uma dívida de US$ 30 milhões. Isso, somado a falência de seu estúdio, o American Zoetrope, fez com que o diretor entrasse em um período conturbado e teve que aceitar dirigir e associar seu nome a diversos trabalhos encomendados.

Em 1990, completou a série de “O Poderoso Chefão” que, apesar de não ter sido tão aclamado pela crítica como os anteriores, foi um grande sucesso de bilheteira. Em 1992, ganhou um Leão de Ouro concedido pela sua carreira.

 

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