Musicais não são muito prestigiados pelo público no cinema. São tratados como longos, cansativos e arrastados. Mas nem sempre foi assim. No início do século 20, eles eram os mais procurados por aqueles que queriam assistir a um filme, principalmente na época das grandes produções de Hollywood. Basta lembrar do clássico “Cantando na Chuva” (1952), com Gene Kelly, e todos os outros estrelados por Fred Astaire.
Das últimas produções do gênero, o que mais fica na lembrança é “Chicago” (2002), de Rob Marshall, mesmo diretor de “Nine” (2009). Este último, aliás, foi inspirado: “8 ½”, de Federico Fellini, de 1963. Outra produção que pode ser recordada com um certo saudosismo é “Moulin Rouge” (2001). E “Mamma Mia!” (2008) pode ser facilmente esquecido.
Adaptação do musical da Broadway, “Os Miseráveis” (“Les Miserables”), inspirado na obra do escritor francês Victor Hugo, chega aos cinemas. Durante a Revolução Francesa no século 19, Jean Valjean (Hugh Jackman) rouba um pão para alimentar a irmã mais nova, mas é preso pelo crime. Durante anos ele é perseguido pelo policial Javert (Russell Crowe).
Após ser solto, Valjean procura a filha de Fantine (Anne Hathaway), ex-funcionária de uma fábrica que caiu nas ruas para ganhar dinheiro. Daí pra frente, histórias se entrelaçam e se cruzam de forma harmoniosa.
A fita, dirigida por Tom Hooper (“O Discurso do Rei”), traz apenas diálogos cantados. É difícil, por exemplo, encarar o fato de que Russell Crowe, ator conhecido por suas atuações em filmes de ação, como “Gladiador” (2000), comece a, de repente, cantar enquanto lidera a tropa.
A interpretação de Anne Hathaway é oposta. Mesmo com a voz embargada da mãe que está sofrendo por não ter dinheiro para mandar para a filha, ela canta. E as músicas, vale salientar, são lindíssimas, como “I Dreamed a Dream”, “Bring Him Home”, “One Day More” e “On My Own”.
Helena Bonham Carter e Sacha Baron Cohen fazem parte do núcleo cômico da trama. Helena já foi vista em outros musicais, como “Sweeney Todd – O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet”, dirigido por seu marido Tim Burton e estrelado por Johnny Depp. Baron Cohen, com sua expressão irônica e debochada de outros filmes (“Borat”, “O Ditador“), envolve o público em mais trapalhadas, fazendo com que a trama se torne um pouco mais leve, mas tenha o peso que o assunto merece, já que trata-se de uma obra escrita em 1862.
Embora se passe na França do século 19, o longa-metragem é cantado em inglês. Vez ou outra um personagem se refere a uma pessoa como “madame” e “monsieur”. Esse uso do francês apenas para tratamentos pessoas irritam um pouco o espectador, como se o elenco só fosse capaz de dizer aquelas palavras no idioma de Molière.
“Os Miseráveis” trata da Revolução Francesa, das dores causadas pelo incidente, mas também de amor não correspondido e pelo sacrifício feito no papel da mãe, que aceita cortar o cabelo, vender o dente e o corpo em troca de alguma moeda.
A fita não pertence a um gênero amado por unanimidade pelos cinéfilos, mas “Os Miseráveis” encanta pela produção, por algumas interpretações mas, sobretudo, pelas canções.
Vencedor de três prêmios no Globo de Ouro (Melhor Comédia ou Musical, Atriz Coadjuvante para Anne Hathaway e Ator para Hugh Jackman), o longa concorre a oito Oscars, incluindo as categorias principais.