Ambientado no fim dos anos 1960 e início dos 1970, “Um Olhar do Paraíso” (“The Lovely Bones”) começa contando, em off, a história de uma personagem, que depois saberemos tratar-se de Abigail Salmon (Rachel Weisz). Ela, aliás, é mãe de Susie (Saoirse Ronan), personagem de quem a história passa a ser contada. Isso porque, no meio do caminho, entre as narrações e nos primeiros 15 minutos da fita, a garota, que tem 14 anos, comenta algo sobre seu assassino.

Corta e volta para o início da história. A fita é baseada no livro “Uma Vida Interrompida – Memórias de um Anjo Assassinado”, de Alice Sebold, e mostra um pouco sobre os mistérios da vida e da morte (ou será da vida após a morte?). Neste caso, contudo, o espectador vai conhecer como a garota morreu e de onde ela narra a história.

Para tanto, o diretor Peter Jackson (da trilogia “O Senhor dos Anéis”) aponta suas lentes para a família da garota morta. Antes, porém, conta sobre como era sua vida. Reúne informações para preparar o espectador. E a espera é longa – e arrastada.

Na construção da história, o espectador passa a conhecer seus amigos da escola, seu paquera, seu relacionamento com os pais, com a avó. Essa, aliás, é um personagem caricato, vivido por Susan Sarandon, em um figurino que mostra bem a época em que está e como lida com a vida, arruma a casa sem tirar o salto alto, os cílios postiços e sem largar o copo de uísque e o cigarro. Mas é vivendo no limbo, ou seja, entre o céu e a Terra, que Susie se mostra perdida, sem saber o que lhe aconteceu e o que será da sua família dali em frente.

Filmes sobre a morte, essa desconhecida, há aos montes no cinema, basta lembrar de “Ghost – Do Outro Lado da Vida” (1990), quando Patrick Swayze tenta ajudar a namorada, vivida por Demi Moore, após ser assassinado. Ou “Amor Além da Vida” (1998), estrelado por Robin Williams, que morre e deixa a sua esposa na Terra. Ela, porém, comete suicídio para encontrá-lo. Tim Burton, na animação “A Noiva Cadáver” (2005), mostra o mundo dos vivos (sombrio, sem graça, em preto-e -branco) e o mundo dos vivos (colorido, alegre, animado, cheio de música e dança).

Peter Jackson, aliás, se vale desse diferencial, pois mostra (com toda a sua experiência com os efeitos especiais para detalhar o mundo fantástico) o local onde está Susie: cheio de cor, com paisagens deslumbrantes, ao contrário do lugar frio e cinzento onde vivia antes de morrer. E uma das garotas que lhe ajuda quando chega por ali, avisa: “Aqui não é o paraíso”. Esse lugar, porém, ela só vai conhecer quando se desprender da matéria para desfrutar das delícias que estão a seu dispor. Ela se vê em seu próprio e pequeno mundo (uma alusão ao Pequeno Príncipe?), tem a visão do paraíso, com o milharal, os rios e mares.

A mocinha, no entanto, só vai descansar quando puder entender por que fora assassinada e quando o autor do crime for pego. Ao espectador está claro quem foi, pois ela conta logo no início. Mas o mistério permanece até que seja revelado como tudo aconteceu, o que foi feito do corpo, que continua desaparecido.

A dor do pai, Jack (Mark Wahlberg), e da mãe é outro enfoque, uma vez que, pela ordem natural, os filhos morrem depois, embora nem sempre tudo seja lógico nesta vida. Um dos exemplos desta expectativa, aliás, é reforçado pelo pai à garota, enquanto faz mais uma de suas garrafas que contêm barcos dentro e diz que, quando ela crescer, terá aquilo como parte de sua herança. Sobre o hobby, o pai diz: “Hobbies nos ensinam coisas, como a começar e não parar”.

A história triste faz com que o espectador seja praticamente forçado a refletir sobre a vida e a morte, haja vista as discussões que a protagonista tem e o que pensa assim que morre. Mas talvez por falta de uma interpretação mais convincente ou de uma história mais autêntica (ainda que o espectador possa se prender ao fato de que ela tinha uma vida linda pela frente), o drama de Susie não emociona. Outro motivo é a indiferença da mãe, que, embora tente mostrar que ama muito a filha, não convence: demora a se dar conta do sumiço, pede ao marido para parar de procurá-la após um ano ou mais, vai viver em um local afastado da família para esquecer.

Ao ver “Um Olhar do Paraíso”, dificilmente o espectador deixará o cinema sem um pingo de reflexão, ainda que seja sobre seu futuro ou deste mundo louco que deixa psicopatas à deriva. No entanto, é fácil entender o ditado, independentemente da religião que siga. Afinal, “aqui se faz, aqui se paga”.