Por conta da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o ator mexicano Gael Garcia Bernal veio à capital marcar presença. Isso porque ele participa de duas produções como ator (“Sonhando Acordado” e “O Passado”) e apresenta seu primeiro filme como diretor (“Déficit”).
“O Passado”, dirigido por Hector Babenco, foi o filme escolhido pela organização do evento para abrir a Mostra, na noite de quinta, dia 18. “Não costumo falar sobre os filmes da Mostra, mas escolhemos ‘O Passado’ por ser um filme grandioso”, disse Leon Cakoff, diretor da Mostra, durante entrevista coletiva.
Na coletiva para a imprensa, realizada na tarde de sexta-feira, dia 19, esteve presente o elenco do filme, assim como o diretor. Na ocasião, Babenco aproveitou para falar sobre o fato de ter no elenco o ator Paulo Autran, que morreu no início do mês. “Eu queria trabalhar com o Paulo antes que ele nos deixasse, mas não tinha personagem para ele, apenas uma espécie de Professor Aloprado. Ele participa de uma cena na qual tenho as três personagens femininas no mesmo ambiente. O Paulo disse que se não houvesse um personagem, o ator tinha a obrigação de dar forma”, comenta Babenco sobre o fato de esse ter sido o último filme do “rei dos palcos”.
Também não faltaram elogios entre os entrevistados, já que as atrizes Analía Couceyro, Moro Anghileri e Ana Celestano também falaram da oportunidade de trabalhar com estrelas como Hector Babenco e Gael Garcia Bernal.
“Havia muita expectativa para estar no filme e de trabalhar com o Gael e com o Babenco. É um livro muito lido e os personagens são bem delineados. Parece-me que os ensaios foram muito ricos e de muito aprendizado”, garante Moro, que faz a personagem Vera. Ana, no entanto, diz que foi um pouco difícil no começo, “porque as primeiras cenas foram em francês e a expectativa de trabalhar com Gael e Babenco era muito grande”. Já Analía garante que “a experiência foi feliz e intensa”. “Eu tinha prazer em trabalhar com o Hector e com o Gael e a oportunidade era boa, mas procurei, durante os ensaios, não ficar pensando que estava trabalhando com os dois”, completa.
Gael, que parecia um tanto recluso no contato com os jornalistas, disse que não costuma escolher um filme partindo do princípio de onde ele vem, mas pelo contexto. “O que me chamou atenção foi trabalhar com o Hector, uma pessoa que eu admiro muito desde que vi ‘Pixote’, e também trabalhar na Argentina”, diz o ator. Para construir o seu personagem, um tanto quanto atormentado, Gael disse que não teve muito tempo. “Fui construindo pouco a pouco o personagem e já estávamos imersos na filmagem. Esta é a diferença do teatro e do cinema”, diz, uma vez que no teatro sempre há a oportunidade de aprimorar a interpretação entre uma apresentação e outra.
Uma das principais questões abordadas no filme é a relação entre homens e mulheres, mas principalmente até que ponto uma mulher pode chegar para obter aquilo que quer, o ciúme doentio e o quão bobo um homem pode ficar ao se apaixonar. Mas bobo no pior sentido, porque é capaz de cair em ciladas premeditadas, além de recorrer à autodestruição. “O filme é um estereótipo, um recorte. Tem muitas leituras possíveis e são pontos de vista masculinos sobre as mulheres. Acho que Rimini (vivido por Gael) é um personagem que não entende o que está acontecendo”, diz Analía. Moro aposta que o filme é um ponto de vista do Hector Babenco. “Me assusta o filme”, confessa.
Provocado por ter feito papel de um homem tolo, Gael diz que “essa atitude anti-heróica é comum por qualquer personagem que se deixa levar pelo destino”. Para arrematar, o diretor dá o seu parecer: “Temos tendência de imaginar que a arte e o cinema têm de ser como na vida real. Eu dizia ao elenco: ‘É um filme’. Estamos fazendo ficção e estamos envolvidos com a dramaturgia, e quando entramos em um filme mais realista, temos tendência de tentar trazer algo que não havia sido mostrado antes”, acrescenta Babenco.
“O Passado” é o tempo todo perturbador, mas a experiência para cada um só pode ser apreciada depois de assisti-lo.
Em tempo: ao apresentar ao público o seu filme, “Déficit”, na Faap (Fundação Armando Álvares Penteado) no sábado, dia 20, Gael Garcia Bernal participou de debate com o público formado por cinéfilos e alunos da Fundação. Na ocasião, ele se mostrou bastante realista com sua obra e muito mais à vontade para discutir com o público e responder às perguntas intermediadas por Leon Cakoff e pelo apresentadora da TV Globo Serginho Groisman.