Cura da doença através da conversa. Essa foi, no início do século 20, a sugestão de um audacioso médico suíço, Carl Gustava Jung, inspirado no método utilizado por um médico austríaco, que veio a se tornar o pai da psicanálise. Seu nome? Sigmund Freud. O método utilizado por ambos, assim como o relacionamento entre eles, são temas do longa-metragem “Um Método Perigoso” (“A Dangerous Method”), que estreia nesta sexta-feira, 30 de março, nos cinemas. A fita, que concorreu à Palma de Ouro em Cannes, no ano passado, também teve indicação ao Oscar, mas voltou para casa sem nada. Injustamente.
Dirigido por David Cronenberg (“Senhores do Crime”, “Marcas da Violência”) e escrito por Christopher Hampton (“Desejo e Reparação”), o longa foi inspirado em sua própria peça, “The Talking Cure”, além do livro de John Kerr, “A Most Dangerous Method”. A narrativa se passa às vésperas da Primeira Guerra Mundial, quando Zurique (Suíça) e Viena (Áustria) são os cenários para a história que envolve descobertas sexual e intelectual.
A questão é que “Um Método Perigoso”, baseado em fatos reais, parte da internação de uma jovem russa, Sabina Spielrein (Keira Knightley, de “Orgulho e Preconceito”), em consequência de visíveis problemas psicológicos ocasionados na infância reprimida. Seu problema parte, principalmente, da histeria e humilhação que sofria pelo pai. A internação, aliás, fora proposta por Jung, no filme vivido por Michael Fassbender (“Bastardos Inglórios”), justamente com inspiração nos tratamentos de Freud (Viggo Mortensen, de “Marcas da Violência”, “A Estrada“).
Outra personagem importante é o paciente Otto Gross (o ator francês Vincent Cassel, de “Cisne Negro”), que é pervertido e está determinado a ultrapassar os limites, já que leva em conta a opinião de que nada deve ser reprimido (do uso de drogas à poligamia).
Faz parte de sua proposta incentivar os outros a tomarem atitudes semelhantes, já que, segundo Freud, muitos dos problemas comportamentais estão diretamente ligados à sexualidade. É dele o conselho a Jung: “Não passe pelo oásis sem parar para beber”.
Neste turbilhão de conflitos, o espectador vai vivenciar uma avalanche de opiniões sobre o mesmo tema e, o mais importante: que as ideias expostas começaram a ser divulgadas pelos médicos em 1904.
Para recriar o ambiente da época, o filme lança mão do figurino impecável, além de levar para as locações a realidade da época. Até mesmo a casa onde Freud viveu foi utilizada.
Cronemberg, especializado em suspenses e filmes de terror, se mostra um pouco perdido quando o assunto se volta para o drama. Principalmente por conta da interpretação dos atores, já que a atuação de Keira parece um pouco exagerada para o seu problema. Logo no início, o espectador se depara a uma cena bastante forte, que inclui a internação de Sabina, com direito a pontapés e gritos histéricos.
“Um Método Perigoso” traz diálogos construídos com frases feitas pelos médicos, e frisa bastante o fato de Freud achar que (quase) tudo o que acontece na vida das pessoas tem a ver com a sexualidade. Sublinha também a vida tranquila que Jung tinha, no quesito econômico, já que a sua esposa era rica e ambos, arianos. E também o discutido envolvimento de paciente e médico.
Além do momento que a Europa vivia neste conflito intelectual, o diretor oferece uma pincelada na questão do Holocausto, já que tanto Freud quanto Sabina eram judeus (Freud foi expulso da Áustria e a russa voltou para a sua terra natal, onde morreu fuzilada).
“Um Método Perigoso” reúne um grande elenco e traz para a sala de cinema uma discussão importante e, quem sabe, acaba se tornando uma verdadeira terapia de grupo.