Diretor conhecido por filmar sempre perto de sua casa, em Nova York, Woody Allen quebrou a rotina quando realizou quatro filmes seguidos na Europa, sendo três na Inglaterra e um na Espanha [respectivamente “Ponto Final – Match Point” (2005), “Scoop – O Grande Furo” (2006), “O Sonho de Cassandra” (2007) e “Vicky Cristina Barcelona” (2008)].
Como produz praticamente um filme por ano desde 1965, o último que fez e que chega ao Brasil dia 30 de abril é “Tudo Pode Dar Certo” (“Whatever Works”). Nesta produção, portanto, Woody Allen retorna ao lar e faz de sua cidade preferida o pano de fundo, ou melhor, uma outra personagem para a sua história. Retorna, também, à comédia, seu gênero preferido – embora tenha feito muitos dramas ultimamente.
Na fita que ele dirige e escreve, o protagonista é Boris Yellnikoff (Larry David), um aposentado que um dia ganhou um Prêmio Nobel em mecânica quântica por seu trabalho e vê sua liberdade ameaçada, depois de já ter se divorciado. Isso porque uma jovem ingênua, Melody (Evann Rachel Wood), chega a Big Apple vinda do sul do país e, como não tem onde passar a noite, pede a ele para ficar um dia em seu sofá.
No entanto, os dias vão se estendendo, até que ambos começam a conviver mesmo com a grande diferença de idade e todas as manias que Boris possui e das quais não abre mão (como a incessante necessidade de lavar as mãos e cantar ao mesmo tempo). Para rechear ainda mais a história, há o envolvimento de outros personagens, como os pais da menina (Patricia Clarkson e Ed Begley Jr.) e os amigos de Boris.
O longa-metragem mostra as características do diretor, principalmente na abertura (o mesmo tipo de letreiro em preto-e-branco), a orientação urbana de filmar (sempre incluindo apartamentos, cafés, restaurantes, ruas de Nova York e longos passeios pela cidade enquanto a câmera o acompanha em plano-sequência), diálogos longos e bem construídos e, sobretudo, um bom humor sarcástico e impagável. Para completar, a maneira preconceituosa de tratar as pessoas, sempre se achando mais inteligente e superior a todos.
Boris é o alterego de Woody Allen, um ranzinza nato que reclama de tudo e tem aversão a badalações. Segundo ele mesmo conta, gosta mesmo é de assistir aos seus jogos de basquete e torcer para os Knicks, tocar seu clarinete e ficar com os filhos. Outra semelhança entre o roteiro e o diretor é que Woody também é casado com uma jovem cerca 30 anos mais nova que ele.
No meio dos diálogos, Allen insere o nome do longa-metragem em diversas situações, faz seu protagonista olhar para a câmera, como se estivesse falando diretamente ao espectador (e finaliza a fita desta maneira, refletindo se sobrou alguém na plateia – uma vez que seus filmes não costumam fazer sucesso e render muitos milhões nas bilheterias, mas possui o público cativo e Allen sempre alegou que faz filmes para se divertir). Entre as discussões, há a religião e fala também dos judeus (ele, aliás, é judeu). Há discussão sobre o cinema, o Oscar e, quando Boris liga a televisão, começa a assistir a um filme estrelado por Fred Astaire.
“Tudo Pode Dar Certo” não é o melhor filme de Woody Allen, mas com certeza reserva ao espectador momentos de bastante reflexão, descontração e divertimento com direito a piadas inteligentes – acima da média de outras produções cinematográficas. Uma experiência que, sem dúvida, vale a pena – e o ingresso do cinema.