Memória Cinematográfica

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Ensaio Sobre a Cegueira

Entrevista Nacional 29 agosto 2008

Para divulgar o lançamento do longa-metragem “Ensaio Sobre a Cegueira” (“Blindness”), que estréia no Brasil dia 12 de setembro, o cineasta Fernando Meirelles e as atrizes Alice Braga e Julianne Moore estiveram em São Paulo para coletiva de imprensa. Na ocasião, o produtor canadense Niv Fichman afirmou que possui os direitos do filme há 10 anos, e o roteiro, escrito por ele, demorou sete anos para ficar pronto.

Vale lembrar, ou melhor, Meirelles fez questão de frisar, que não se trata de uma produção hollywoodiana, já que é canadense por conta do Niv; japonesa, porque os financiadores são de lá – a produtora Sonoko Saka conseguiu 60% do dinheiro de investidores japoneses – e brasileiro. “Porque depois que eu entrei, a equipe toda de criação é do Brasil, com exceção do roteirista: fotógrafo, montador, músicos, diretor de arte, diretor”, completa ele.

Julianne Moore, que estrela pela primeira vez um filme de Meirelles, conta que ficou encantada com o Brasil (tanto é que acaba de voltar das férias com os filhos na Amazônia) e afirma estar muito feliz de ter participado do filme. “Faria qualquer coisa que o Fernando pedisse”, pontua.

Atriz brasileira, que ultimamente tem se destacado no mercado internacional, com “Cinturão Vermelho” e “Eu Sou a Lenda”, Alice Braga volta a filmar sob a batuta de Meirelles, já que sua estréia no cinema aconteceu com o filme “Cidade de Deus”. “Eu já tinha lido o livro cerca de quatro, cinco anos antes e é bom estar de volta com o meu padrinho”, derrete-se.

Na montagem do filme, conforme consta do seu blog escrito durante as filmagens, Meirelles conta que precisou cortar algumas cenas. “É um processo normal. A cena do estupro eu cortei porque era extremamente violenta e ao mostrar para o público teste (screening tests) vi gente saindo da sala. Isso desconectava o espectador do filme, porque ficava chocado.” Ele aproveita para confirmar a pergunta e diz que essas cenas estarão no DVD “para aqueles que quiserem ver”.

As atrizes, no entanto, não se lembram de cenas que tenham filmado e que foram cortadas. “Confio plenamente na visão do diretor e cabe a ele avaliar se a cena é boa ou não”, diz Julianne.

Cidades
“Ensaio Sobre a Cegueira”, longa-metragem baseado no livro do escritor português José Saramago, se passa em três países diferentes, mas em nenhum momento é dito. Além do Canadá, há filmagem no Uruguai e no Brasil – em São Paulo, especificamente. Para as filmagens, a produtora Bel Berlink e a CET fecharam ruas e avenidas, para deixar pouca gente circulando. “Na pós-produção, apagamos algumas coisas que restaram”, revela. E Meirelles complementa: “Espalhávamos a sujeira e depois recolhíamos tudo para deixar São Paulo de novo para as pessoas. Filmávamos enquanto havia luz e duas da tarde recolhíamos tudo”.

Como trata-se de um filme denso, Julianne aproveita para falar sobre sua personagem, que é a Mulher do Médico, ou seja, a única que finge que não enxerga. “Acredito que temos um instinto de sobrevivência inato e muitas vezes a gente acaba aceitando qualquer coisa. Mas a história prova através dos crimes de guerra que muitas vezes a gente acredita no governo e crê que alguém vai cuidar da gente. Isso está no livro do Saramago. E na verdade não é bem assim. Acho que isso é uma influência que veio do cinema. Achamos que a qualquer momento o Bruce Willis vai aparecer”, brinca ela, afirmando que sua personagem não é o Batman.

Efeitos especiais
Para dar o efeito de como os personagens cegos vêem, ou seja, uma brancura feito o leite, Meirelles utilizou artifícios. “O branco foi apenas um dos truques. Utilizamos imagens saturadas, reflexo, imagem virtual, planos mal-enquadrados e fora de foco. A imagem e o som do filme se dissociam a partir de um determinado momento, de modo que é como se o olho estivesse de um lado e o som do outro, tal como os cegos agem. Tivemos a intenção de colocar o espectador no mundo da cegueira”, explica o diretor.

Depois de ter filmado o nacional “Cidade de Deus”, Meirelles filmou “O Jardineiro Fiel”, uma produção inglesa. Ele diz que pretende continuar não aceitando fazer filmes de estúdios, e permanecer independente. “Estou filmando para a TV Globo. E uma solução boa seria fazer filme internacional e filmar em português outros projetos para a tevê”, dá a dica.

Sobre a empreitada, diz que não é um cineasta engajado. “Faço filmes que me interessam.” Ele explica que “Cidade de Deus” era um filme que ninguém queria ver, com não atores e o investimento foi todo dele. Em “O Jardineiro Fiel”, foi um filme no qual “dei um passo maior do que poderia agüentar”. “Neste, não existe narrador, os personagens não têm nomes, trata-se de uma doença que não existe”, completa. “Não conseguia imaginar se as pessoas poderiam se interessar por eles. Meu próximo filme vai ter de ser mais fácil!”, brinca.

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