É nos primeiros 15 minutos do longa-metragem “Habemus Papam”, que foi apresentado no Festival de Cannes e na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo no ano passado, que uma das personagens faz o anúncio a uma multidão que rodeia o Vaticano, na ocasião. Isso porque o papa anterior havia morrido e, após a votação dos cardeais, um deles segue ao balcão para fazer o anúncio à multidão, após mandar o sinal de fumaça branca. Depois de uma abertura em italiano, o cardeal diz, em latim: “Habemus Papam!” Não fosse o acontecimento seguinte, o filme poderia terminar aí.
Dirigido pelo cineasta italiano Nanni Moretti, vencedor da Palma de Ouro por “O Quarto do Filho”, o longa é uma mistura de comédia e drama com foco no dilema da eleição do novo papa que é escolhido inesperadamente e não consegue aceitar o peso de suas novas responsabilidades. A cena do balcão de frente para a Praça São Pedro, que, aliás, está no trailer, é antológica.
Está certo que o papel que o papa desenvolve dentro da igreja católica é um fardo, e isso é mostrado no início da fita, quando os cardeais torcem para não serem escolhidos, mas, ao mesmo tempo, seria o destino óbvio daqueles que estão ali. Uma hora, você será escolhido. Ou não. A preparação natural deve ser feita. E o olhar de Moretti humaniza o Vaticano ao revelar que os cardeais também sofrem e passam pela pressão da sociedade, de precisar dar sempre o apoio e a palavra que se espera.
A parte cômica do filme acontece principalmente com a chegada do diretor como personagem. Isso porque Nanni Moretti vive o psicanalista que vai tratar do medo do papa eleito (vivido por Michel Piccoli, do clássico “A Bela da Tarde”). E o riso vem naturalmente por conta da relação do psiquiatra com o papa, que deve ser cautelosa, já que ele não pode tocar em todos os assuntos e tem sempre uma plateia ao redor para ouvir a consulta.
Na última edição de 2011 da revista francesa “Cahiers du Cinéma”, o filme havia sido visto por mais de 700 mil pessoas na França, um dos maiores sucessos do cinema de autor naquele país. O que já é um atestado a mais para se ir ao cinema conferir a obra, que traz diálogos bem construídos e personagens consistentes.
“Habemus Papam” pode soar um filme religioso, especialmente dedicado aos católicos, mas a mensagem que ele passa é que o mundo perdeu a cabeça e está tudo ao contrário (vide os problemas econômicos e políticos que rondam a Europa). Por esses motivos e outros, e pelo fato de podermos rir daquilo que é sério, é que o longa-metragem vale a pena.